“É o silêncio que as coisas guardam, quando somem os dualismos possíveis” — entrevista com Árion Lucas

editora Urutau
3 min readJul 6, 2020

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A 90ª de uma série de entrevistas com as/os poetas da editora Urutau

por Silvia Penas Estévez & nósOnça

Árion Lucas (Rio de Janeiro, 1992)

O que é poesia para você?
É o silêncio que as coisas guardam, quando somem os dualismos possíveis… Pra mim é uma entrega à energia criadora que conecta o mundo, traduzir o desconhecido pra despertar nos outros uma mudança de consciência

Quando escreve, pensa em interlocutores? Sua escrita lhe afeta?

É um aprendizado inevitável de desapegar do pensamento a ponto da escrita não afetar o processo. Mas as pessoas estão sempre lá em alguma camada. Fico vazio quanto mais sou capaz de escutar, aberto a fazer daquilo um meio pra algo maior

Quais são os/as poetas da atualidade/vivos/vivas que mais lhe tocam nesse momento?

A maioria das pessoas que admiro já estão mortas, salvo talvez a Adélia Prado e alguns compositores… Acho a Matilde Campilho uma das vozes fora da curva que iluminam hoje, com uma alquimia autêntica de transformar pela palavra

O que você opina sobre as redes sociais como difusoras de arte? Colaboram de certa forma para a existência da poesia?

Acredito que nosso subconsciente vem se fragmentando por causa das redes sociais. Mas também elas são fruto de mídias que pra passarem suas mensagens dependem de elementos que originalmente pertencem ao campo artístico. É uma questão de encarar essa nova era de textos na tela e fotos no feed com o potencial linguístico que ela tem, fazer desse caos um instrumento que ajude a unir os pontos dispersos e desestabilizados

Nos últimos anos tivemos uma série de acontecimentos no Brasil (do fim da era Lula à ascensão da extrema direita) e também uma maior visibilidade aos movimentos de lutas sociais (feminista, LGBTQIA+, indígena, quilombola, anti-racistas…) — isso reverbera na sua criação literária?

Vejo essa ascensão do ódio em parte como reflexo do medo pela complexidade da atomização. Mas esses movimentos de luta social vieram junto pra revelar vozes que só aumentam o espectro de faces a se somar na natureza humana. Podemos fazer isso deixando reverberar em nós o máximo de espíritos ao redor até nos integrarmos a eles. Tentar não nos iludirmos pelo estranhamento em reflexos falsos do que projetamos de nós mesmos

O seu poema nasce de súpeto, como algo que golpeia e sai de uma maneira explosiva e rápida ou é um processo mais pausado e longo?

Talvez a busca da frequência desse nascimento seja longa e pausada, mas o poema sai justo quando eu desisto e me entrego a esse súpeto. São ciclos que nunca vão mudar enquanto estiver acontecendo alguma coisa no planeta. Sempre vai ter algo a ser descoberto nessas idas e vindas conforme avançamos na luta por encontrar um equilíbrio

Silêncio a lapsos (editora Urutau, 2019)

O seu livro, Silêncio a lapsos, como ele surgiu?

Acho que teve um despertar na comunidade poética de modo geral, com tudo pegando fogo enquanto as redes permitiam novas narrativas… No meu caso esse livro veio depois de muitos anos sem escrever nada, até sentir algum dia que tinha algumas coisas a acrescentar ao movimento

Qual é o seu verso favorito do livro? Há alguma explicação?

Não sei dizer essa. Considero todos eles iguais. Às vezes gosto mais de uns, outras mais de outros

Como você conheceu a editora Urutau?

Eu tinha conhecido minha namorada fazia uns meses, quando ela me avisou que a editora tinha feito uma chamada… Essa é uma das grandes bênçãos pelas quais sou grato hoje, assim como tudo que vivemos juntos nesses anos

Alguma observação que queira acrescentar?

Não, nenhuma. Só agradecer pela oportunidade. Sempre bom os diálogos rolarem

Árion Lucas

é um escritor carioca nascido em 1992. Largou Design, terminou Jornalismo, mas hoje vive de literatura. Silêncio a lapsos é seu primeiro livro de poemas.

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